29.2.20

[Resenha] O Mundo de Aisha



O mundo de Aisha é uma História em Quadrinhos escrita e desenhada por Ugo Bertoti com base nas entrevistas jornalísticas e fotografias de Agnes Montanari. A HQ vai misturar desenhos com as fotografias originais e contar a história de quatro iemitas: Aisha, Nabiha, Sabiha e Ghada abordando a opressão e violência comum a muitas mulheres da região. Reprimidas e sem possibilidade de expressão, cada história revela como cada uma tenta perfurar de alguma forma as paredes sufocantes do machismo no Iêmen.
Se me perguntassem se eu sabia que existia esse lugar eu diria que não, mas sei que em todo lugar desse mundo existem mulheres sendo oprimidas, umas mais que outras, claro. Pela voz das próprias mulheres, tomamos conhecimento de um assunto muito difícil para nós ocidentais entendermos: o uso do véu, NIQAB. Toda a sociedade gira em torno do controle da "honra" e dos corpos das mulheres. Pelo menos nessas quatro histórias, o véu se mostra uma questão de muito debate entre elas mesmas e um símbolo poderoso, ao ponto que tirar ou não pode decidir entre a vida ou a morte de uma mulher. Logo no início é dito "na dúvida, sugere-se às mulheres que decidam por si mesmas, naturalmente, levando em conta as circunstâncias. O fato é que os homens estão acostumados há séculos a vê-las cobertas. É claro, portanto, que a mulher tende a adequar seu comportamento a essa situação. Para poder viver em paz.". Ou seja... uma escolha ou uma condição?


Sabiha foi comprada para ser esposa de um homem 12 anos mais velho que ela, esse é um destino comum de meninas na região, aos 13 anos já estava grávida.
Hamedda é uma senhora que conseguiu administrar o restaurante mais famoso do lugar, fala dos preconceitos que encara por ser uma mulher a frente de um negócio.
A terceira história é de Aisha, que se entrelaça com outras mulheres (Houssen Ghada, Ouda e Fatin). Temos de novo o mesmo quadro: mulheres que vivem para o casamento e para obedecer e agradar ao marido. O irmão de Aisha é o homem que precisa cuidar da honra da casa e sempre briga com a irmã, pois ela está "dando o que falar" ao não usar o NIQAB. A mãe dela aconselha a usar "para sua tranquilidade". As amigas de Aisha já trabalham, podem almejar profissões, estudar fora, mas ainda precisam lidar com as mesmas questões: casamento, o véu, a honra.


No mundo de Aisha, liberdade versus tranquilidade parece ser a grande encruzilhada das mulheres iemitas, a hq consegue ser um documentoso valioso que mostra o jogo entre aceitar uma tradição ou enfrentar como puder essa opressão em busca de emancipação, correndo em alguns casos risco de vida é muito mais complicado do que pensamos. Uma coisa é certa, a revolução das mulheres iemita não se dá só no âmbito individual, ao unir as quatro histórias a hq coloca que esta luta é de todas.



[Resenha] Como se fosse a casa - Ana Martins Marques e Eduardo Jorge



Fazia um tempo que queria ler esse livro desde que li O Livro das Semelhanças da Ana Martins Marques. O Eduardo Jorge, o outro escritor deste "Como se fosse a casa", eu não conhecia, mesmo sendo conterrâneo. O livro surgiu de um convite da editora para a Ana que resolveu compilar trocas de emails entre ela e o amigo. Ele estava fora do país e ela morando na casa dele. Existe toda essa dança sobre dois poetas conhecendo um espaço, uma casa. Ambos de perguntam sobre o que é habitar, morar, se mudar, como se constrói uma nova rotina, observam ruas, sombras, luzes e os barulhos da rua e como tudo isso forma quem você é momentaneamente. Eu acho até bonito tudo isso e gosto da ideia. Porém, me decepcionei um pouco com a leitura. .
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Toda a diagramação é linda e o livro tem um lado bem delicado, mas nem de longe foi mesmo arrebatador. Alguns versos de Ana Martins me chamaram atenção como "(entre tantas coisas/numa separação/é também uma língua/que se extingue)". Mas não sei como dizer que achei um tanto forçado... .
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Eu fico um pouco enfadada de um certo estilo da poesia contemporânea classe média feita no sul/sudeste de pessoas que decidem escrever porque fazem um intercâmbio pra Europa e resolvem colocar nomes de ruas e estações de metrô que ninguém mais foi lá... claro que uma mudança, conhecer outros lugares nos dá o ímpeto de escrever sobre. Eu mesma sempre escrevo um pouco quando viajo, mas acho que existe isso... demaaais hoje em dia. Deve ter começado um pouco com a galera dos anos 70. Vejo isso na Ana Cristina Cesar, que coloca palavras em inglês e eu adoro. Mas hoje eu sinto um distanciamento chato sobre esse recurso de ficar sendo o brasileiro na europa. Principalmente nos poemas do Eduardo Jorge que isso acontece, pois ele era o estrangeiro la fora. E a Ana a estrangeira na casa dele.
Na orelha é dito que este é um livro denso e corajoso, eu sei que a orelha quer vender o livro, mas não me chegou nada disso... continuo enxergando certa beleza na criação física dessa comunicação entre os poetas, mas talvez não fosse o momento pra mim. Longe também de não recomendar o livro, pode ser especialmente inspirador para quem está de mudança.




12.2.20

O Apanhador no campo de centeio - J.D. Salinger

"Aqui o que ele disse: A marca de um homem imaturo é que ele quer morrer nobremente por uma causa, enquanto a marca do homem maduro é que ele quer viver humildemente por uma"



O apanhador no campo de centeio foi escrito em meados dos anos 40, e se tornou mundialmente um clássico "fundamental", creio que como dizem os especialistas, ter se detido a tratar de um tema pouco abordado até então: a adolescência, e melhor, pelo próprio viés do adolescente. Por conta disso, o livro tem uma linguagem característica, também pouco usada na literatura, uma narrativa repleta de gírias e coloquialismo, sem se preocupar em trazer uma escrita "nobre".

Comecei a ler the catcher in the rye em Dezembro, peguei emprestado de um amigo, estadunidense e resolvi ler no original sem saber, aliás, que, faria muito diferença. Não li a tradução nova que saiu pela Todavia e está sendo bem elogiada, mas esse é um livro que creio ser outra coisa quando traduzido. 

Pra quem, assim como eu, nunca tinha lido o famoso o apanhador no campo de centeio, vou tentar resumir o enredo (apesar de que eu mesma, nunca quis ler sobre """o que acontece""" nesse livro, pra guardar o gostinho da surpresa e particularmente acho bem sem graça contar os fatos que se desenrolam numa narrativa, porque parto da ideia de que "o que acontece" não resume uma obra, tanto que acho graça quando as pessoas dizem que nada acontece num livro ou filme, presas a uma ideia tradicional de reviravolta, climax e desfecho. Esse por exemplo, é um livro que nada acontece em boa parte da história. 

A história é narrada em primeira pessoa e, Holden Caulfield, nosso odiado protagonista, tem 16, está no ensino médio e foi expulso pela segunda vez da escola, ele iria para casa um pouco depois do Natal (acho que é, viu como não me apego "ao que acontece"), sem que os pais dele soubessem que ele foi expulso de novo. Mas decide sair dias antes e ficar vagando por Nova York, se deprimindo até chegar na decadência máxima que ele poderia chegar. É então, basicamente isso que acontece. Mas como a professora Maria Elisa Cevasco diz: ele fica adiando o momento de dizer que ele é um desajustado

Eu havia demorado a ler esse livro por pura negligência com clássicos e porque um amigo meu falava muito mal do personagem toda vez que eu comentava que queria ler e ficava dizendo pra eu não perder meu tempo. Desculpa, amigo, mas ainda bem que eu não te escutei. É maravilhoso que possamos ler algo para tirar nossas próprias conclusões. Hoje, depois de rever bastante, posso dizer que: amei esse livro, tenho críticas sim, mas podemos gostar de algo e ter críticas a respeito também. 

Primeiro, queria ressaltar que é muito incrível que J.D. conseguiu criar um livro que é basicamente um personagem. O apanhador é sobre Holden, a história é Holden e mesmo que você deteste Holden, J.D. conseguiu dar vida a um personagem que parece tão real que temos todos esses sentimentos muito humanos com relação a ele: ódio, empatia, ranço, abuso, pena, compaixão, etc. Ele criou um personagem que mais de 50 anos depois ainda somos capazes de debater a sua atualidade.

Agora, como eu interpreto Holden Caulfield. De início o narrador, Holden, nos diz que ele não é confiável, essa informação é muito genial, porque a partir do momento em que ele se coloca como não confiável, mas a narrativa é toda conduzida pelas memórias e pelo o que ele escolher narrar, então sabemos que temos uma perspectiva que pode ser meio torta, que pode ser mentira, que pode ser só fruto de um delírio dele, mas é só isso que temos em mãos. 

Holden é um adolescente meio amargurado, que passou por umas bads na vida, mas que também consegue ser muito chato, machista e um pé no saco, o que me faz entendê-lo como: um adolescente de 16 anos, é exatamente isso que J.D. constrói. 

Talvez hoje, depois de lermos tantos personagens "reais demais", tenhamos sede de ler personagens (meninos e homens) que sejam mais legais com as mulheres, que não sejam apenas fruto de uma masculinidade tóxica, que possam mudar e sejam passíveis de mudança. Mas talvez esse não seja o caso nos anos 50, e veja bem, eu não sou nem um pouco a pessoa que justifica machismo pelo contexto histórico, nem estou dizendo que ele é assim mesmo porque tem 16 anos e tá tudo bem. Não tá tudo bem, mas sim, é coerente.  O que em nenhum momento nos impede de enxergarmos que é um defeito, e pela minha interpretação, Salinger não quis dizer que era ok que Holden tivesse esses momentos machistas. 

O que ele coloca pra mim é justamente o quanto ele era miserável e cheio de defeitos e depressivo e tudo mais, mas a grande sacada é: todos os personagens ao redor dele percebem que ele é machista, miserável, depressivo e chato: menos ele mesmo

É difícil acolher um personagem principal que não vai ser um herói perfeito, mas com o toque certo, acredito que é possível construir um bom livro com personagens detestáveis. E não acho que Salinger, a meu ver, até agora, tirando só pelo livro, quis corroborar com todos os defeitos de Holden, pois ele usa a seguinte técnica: colocar um contraponto. 




Bem, sabemos que Holden foi expulso novamente, está com depressão, mas não percebe, e tem um grande desânimo por tudo e todos ao redor, ao mesmo tempo que tenta desesperadamente encontrar algo empolgante para viver e gostar das pessoas e que as pessoas gostem dele, mas ele está tão na merda que acaba sempre ou falando mal de todo mundo, homens e mulheres, ou parecendo muito chato e detestável. 

Eu não tive ódio de Holden, se eu o visse e ele viesse com essas merdas pro meu lado, eu provavelmente iria rir na cara dele, e eu ri muito com esse livro. Porque a grande complexidade é que: Holden critica todo mundo que convive com ele, sem perceber que as pessoas também têm um ponto de vista sobre ele. 

Quando Holden meio que foge da escola que já tinha o expulsado, vai para um hotel qualquer e tudo que ele procura é sentir  alguma coisa muito empolgante com as pessoas, que o faça sair daquele estado de lástima, mas ele não consegue (por causa dele mesmo) e fica todo tempo num ciclo que é: tenta se conectar com alguém, acha todo mundo chato, ele mesmo é um chato, fica depressivo e começa a reclamar dos outros. 

Ele vai ligando para várias pessoas altamente aleatórias e convencendo-as a encontrar com ele para fazer algo, nunca dá certo, ele acaba se mostrando um chato ou percebendo que as pessoas, na visão dele, são chatas e aumentando a angústia que ele sente. Em vários momentos ele disse que tal coisa o deixa depressivo, que ele se sente um lixo, mas também meio que implora para que as pessoas fiquem com ele pois ele se sente sozinho. 

Como eu falei, o que eu achei engraçado, é que Salinger traz essa perspectiva genial: Holden reclama de todo mundo como se ele não tivesse defeitos, numa postura meio boba e imatura, claramente como defesa para não mostrar o quão destruído ele está; ele quer se conectar com alguém de forma sincera, mas ele mesmo não é sincero, ele mente sua idade, mente várias coisas. Então tudo que ele busca nos outros, ele não consegue encontrar nele mesmo. Pra mim, uma típica crise adolescente.

Em dado momento ele vai na casa de um professor que ele gosta (mesmo falando mal do homem, porque ele não quer admitir que tem sentimentos bons pelas pessoas), e o professor dá uma liçãozona de moral, que achei muito interessante. Por esse personagem, é uma pista pra mim que o Salinger não está querendo defender o Holden ou que ele pensa como o Holden.



as partes machistas: bem, primeiro, quando Holden fala sobre estupro, ao dizer que a maioria dos garotos força as meninas a transarem com ele, mas ele Holden não consegue fazer isso e este é o problema. Claramente um menino influenciado por uma sociedade machista, que não só nos anos 50, mas hoje, ainda não consegue entender que NÃO É NÃO. E ai ele acha que é um problema porque ele pensa que deveria ser como os outros garotos (apesar de ele falar mal de todos os outros garotos). Também em todos os encontros que ele tem com mulheres ele acaba objetificando-as, e colocando-as em esteriótipos de fúteis, falsas, essas coisas. A única que ele não vê muito assim é sua vizinha, mas que também é totalmente idealizada, pois ele não consegue encontrar com ela pessoalmente.

A outra personagem feminina é a pessoa mais esperta e madura na vida dele e a única que ele dá ouvidos e ama e respeita: sua irmã mais nova. Você chegou até aqui, teve que aguentar O Reclamão o tempo todo, sendo um pé no saco (ele fala isso de todo mundo, talvez porque ele mesmo seja), mas os diálogos com a irmã tocam lá fundo. E é quando ele percebe que ele que tá destruindo tudo na vida dele, que não é tudo culpa dos outros, que ele é que não gosta de nada, ela dá vários tapas na cara dele e tudo mais. A única outra pessoa que ele admira é também o irmão mais novo dele, que não vou dizer da relação dele porque é spoiler e também diz muito sobre quem o Holden é.

Falando assim, parece só um livro sobre um adolescente birrento, essa também pode ser a sinopse, pois como vemos: é isso que aconteceMas pra mim me permitiu uma análise interessante dessa fase da vida, e eu confesso que eu mesma me vi sendo Holden Caulfield em momentos da minha vida: é uma história sobre quando você está muito mal e não sabe lidar com isso, acaba estragando tudo na vida e por ser muito imaturo desconta nos outros suas frustrações, eu acho que por mais detestável que isso possa parecer, pode acontecer com muita gente.

Esse livro não é sobre justificar as coisas, nem tudo é uma tese para defender ou condenar algo, é sobre essa dinamite de sentimentos que é adolescência, por fim, achei um livro bem sentimental no melhor sentido da palavram, que é rico por trazer toda essa discussão sobre um período da vida, de forma muito íntima, real e vívida.

Todo o descontentamento de Holden parece uma grande implicância boba, mas também vejo que é uma grande virada de chave na vida: quando nos damos conta que nossas expectativas podem se tornar frustantes, quando todo mundo diz pra você se comportar de um jeito e que a vida certinha "do jeito que tem que ser", escola, emprego, amigos, namorados, namoradas são o segredo da felicidade, mas você vai percebendo incompreensivelmente que não é bem assim. Quando nos deparamos tendo que lidar com todas as decepções da vida, inclusive com as decepções em nós mesmos.

Como aponta a professora Maria Luisa novamente, este livro marca um ponto de revolta com o sonho norte americano, no entanto, Holden não prevê uma mudança, não imagina uma mudança, ele apenas odeia tudo, inclusive a si mesmo porque ele também é fruto disso tudo. se revolta, e estagna nesse sentimento, como que um sentimento pré-revolução, mas que não chega a realmente mudar algo. Mas o final aberto do livro, me faz crer, que lemos justamente este pré movimento de mudança em Holden, que pode (ou não), no futuro, resultar em algo maior.




9.2.20

Organizando a vida



Diário de bordo: 9 dias sem acessar o Instagram (na verdade, quando tem pessoas específicas que quero ver o conteúdo eu olho pelo perfil da minha mãe, isso é meio trapassa? kkk há quem diga que isso se chama "desmame")

A ideia de ficar sem instagram inicialmente era apenas de aproveitar melhor o meu tempo, isso eu pensava que significaria ser super produtiva e tal, mas percebi que precisava na real limpar minha cabeça que estava chacoalhando de tanta informação. Isso resultou em simples descanso.

Essa semana que passou então eu não estive super produtiva, pois também estava meio down e ansiosa com várias coisas, principalmente travada no tcc. 

Mas quinta é dia de terapia e também encontro com a orientadora. Na terapia eu pude chorar bem muito e desaguar todas as minhas angústias e encontrar a orientadora e receber o aval dela que eu estou no caminho certo, além de orientações sobre como prosseguir com o tcc me acalmaram um pouco.

Resolvi também encontrar dois amigos para convidá-los a fazer algum projeto com teatro. Por hora decidimos uma leitura dramática de um texto da Sarah Kane (uma dramaturga inglesa que estuamos num grupo independente em 2019), que será no dia 19. E em março faremos um experimento cênico com algum texto do Heiner Muller, um dramaturgo alemão bem legal. Pra daí em Abril vermos ou não se iremos entrar em um processo criativo mais longo.

Esse passo foi bem importante, pois eu fiquei muito paralisada em 2019 sem saber o que fazer, quando muitas vezes a gente só precisa fazer qualquer coisa nem que seja algo muito simples e "pequeno". Ficamos presos na ideia de que temos que de cara criar um projeto super fenomenal ou alcançar um super objetivo logo de primeira e não fazemos nada por medo de começar aos poucos.

Por exemplo, pedir ajuda ou convidar um amigo para um trabalho era algo extremamente difícil pra mim, porque tinha medo de eles recusarem. 

De início meus amigos não queriam de fato realizar uma peça agora, mas ao pensarmos em pequenas ações, as coisas se expandem. 

Tudo pra dizer que as vezes a gente deixa de tentar alguma coisa por imaginar que precisa ser algo muito incrível e gigantesco, eu tenho pensando bastante nisso, que na verdade eu já li em algum lugar sobre quebrar uma grande meta em pequenas metas ou visualizar pequenos degraus para chegar em algum lugar que se quer chegar. 

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Sobre os livros, quero tentar a partir da semana que vem trazer "resenhas" de leituras antigas como The Catcher in the Rye, O mundo de Aisha, Mulheres na Luta, Poesias Escolhidas (Gabriela Mistral) e A Viagem, além dos contos da Virginia Woolf. 



Leituras em andamento: 

  • Harry Potter e a câmera secreta
  • Cartas a uma jovem atriz (Marília Pêra)
  • Grande Sertão: Veredas

Esse mês eu vou me focar em ler livro teóricos de atuação, que acho que não interessa muito fazer resenha, mas farei no blog para quem por acaso estiver estudando teatro e quiser saber sobre esse tipo de conteúdo.

tbr: 
  • Técnica da Representação Teatral (Stella Adler)
  • A Porta Aberta (Peter Brook)
  • A hora do teatro épico no Brasil (Iná Camargo Costa)
  • Ator e Método (Eugênio Kusnet)


5.2.20

Parcerias com editoras - de onde surgiu essa bomba atômica




Estou há apenas 5 dias sem Instagram, mas parece que faz um mês, só pra você vê o quanto essa realidade virtual está entranhada no meu cérebro. 

No entanto, hoje acabei acessado pelo perfil da minha mãe (eita, será uma recaída?) algumas coisas e me deparei com uma postagem da Vra Tata sobre parceiras com editoras e fez TANTO SENTIDO.

Pra quem não sabe o que é, (eu também não sei na prática porque nunca fui """parceira""" de nenhuma editora), algumas editoras abrem anualmente inscrições para produtores de conteúdo da internet, se aceito, a editora manda livros de graça e você tem que escrever sobre eles nas suas plataformas. O questionamento da Vra Tata é: quem ganha mais com isso? Ou melhor, quem lucra mais? 

A princípio parece que uma mão lava a outra, mas é importante frisar a questão: isso não devia valer para todo mundo igualmente. E o que as redes sociais fazem é justamente polir as diversas nuances que nos fazem sermos diferentes para tentar massificar as realidades, para tentar nos tornar todos iguais ou queremos ser iguais a certas pessoas com algum status de valor. 

Acho que a base do que a sociedade valoriza não muda, mas se maquia: no fim todo mundo quer... poder. Hoje, atenção é poder. Se você é uma pessoa a qual as pessoas prestam muita atenção ou pelo menos em números parece que você tem muita atenção, isso lhe dá... poder.

Pra que você usa esse poder? Eu não sei, e pelo o que estou vendo, não parece que a gente estava usando ou pessoas com grande números de seguidores estava usando para mudar muita coisa, já que bem... as coisas estão piorando no planeta Terra de forma drástica. 

Foi percebendo tudo isso que eu vi que eu precisava tentar sair um pouco desta ilusão, um movimento mesmo extraterrestre, já que ficar fora do Instagram, por exemplo, reduziu meu contato com MUITA gente. E estou me sentindo sim um pouco fora da órbita, há 5 dias não recebo avalanches de informação, não vejo um número gigantesco de imagens que nem consigo processar, estou mais isolada, não tenho falado/interagido com amigos a não ser aqueles que já falavam comigo no whatsapp, mas estava preparada para entender que ficarei uns 5 meses sem falar com algumas pessoas, e tá tudo bem!


Voltando um pouco porque eu fui longe demais, parece vantajoso o fato de que eu sendo uma leitora que eventualmente vou comprar livros venha a receber alguns lançamentos de GRAÇA e tire só uma meia horinha para falar desses livros, um favorzinho mútuo que estamos fazendo.. uma parceria.... mas amore, você acha que Bruna Marquezine recebe tudo de graça na casa dela e nunca é paga por assim do nada recomendar, fazer umas fotos e em "meia horinha" escrever sobre os tênis da Puma? Claro que não! 

Aliás, acabei de ver que cada postagem da Tatá Werneck, por exemplo, rende cerca de 50 mil reais para ela. Enquanto nós, "produtores de conteúdo de livros", passamos horas do nosso dia lendo e pensando no momento de fazer uma postagem (eu pelo menos estava funcionando assim), procurando um diferencial (essa eu achei muito boa, é sempre uma dica que encontro sobre produzir conteúdo na internet - que diferencial, amada!!)

Assim como uma editora do porte da Companhia das Letras, Globo, Record, mesmo trabalhando em algo tão valioso para nós como é a leitura, é antes de tudo uma EMPRESA, e ela vai pagar publicidade para outras pessoas que ela considera mais importante, quem tem mais "poder" (de influência) e não para você. A gente se valoriza tão pouco né? 

Por isso que quem vai sair com mais vantagem nessa "parceria" é obviamente a empresa, mandar um livro pra sua casa é nada comparado com o lucro dela, e para mim? Tirar duas horas do meu dia para estar no Instagram, fazendo mil malabarismos para ser "notada", aumentar números de interação, planejar postagens em horas de pico, etc etc, horas do mês lendo um livro SÓ PORQUE FOI MANDADO PRA MIM... será que eu não estava me doando muito mais pra continuar fazendo funcionar um negócio que em anos eu vou ter ganhado o que com isso? 

Agora um parentese: se é realmente esse seu sonho de infância e sua grande meta para daqui há cinco anos é ser parceira de uma editora por este tempo na expectativa de ganhar muitos seguidores e de alguma forma viver financeiramente dentro deste processo (mesmo que nunca chegue aos R$ 50 mil da Tatá Werneck), bem, você provavelmente já deve ter parado de ler esse texto, então vá em frente! (mesmo!). 

O problema é quando quase inocentemente alguém que gosta de livros resolve apenas criar mais um perfil literário porque vê na internet esse espaço maravilhoso de compartilhamento e conexões humanas e entra na toca do coelho de se perceber ""querendo"" e se esforçando mais do que imaginava para ser bem sucedida nesse esquema. 

Novamente, se você consegue balancear sua vida, e atingir seus objetivos pessoais e profissionais e ainda assim dedicar um tempo para comentar de graça sobre esses livros e que isso não é nenhum problema para você, tudo ótimo. Mas sempre bom pensar como isso atinge os outros, quando a gente se torna mais um elemento para engrossar esse caldo.  

Eu não estava conseguindo, por isso saí. Eu deixei de lado em 2019 várias questões que eu precisava resolver, para dedicar cerca de 2 horas por dia (o tempo que eu ficava no Instagram), percebendo que isso parecia um trabalho meu, e não era. 



Eu não sou capaz de agora, balancear isso, então preferi me afastar totalmente para encontrar o equilíbrio e a razão de ter escolhido outras coisas da minha vida. Em 2019 eu não dediquei diariamente 2 horas por dia para estudar teatro, atuação, etc. Por que eu imergi então nas redes sociais assim? Resposta: recompensa rápida (e ilusória, no meu caso).

Nos valorizamos tão pouco mesmo que aceitamos ser transformados em massa homogênea, quando a tal editora manda o mesmo livro pra 100 pessoas e todos os 100 trouxas que talvez nem quisessem aquele livro vão falar sobre e fazer com que mais 100 trouxas comprem um livro que talvez eles também nem quisessem comprar... não agora. 

Eu não exatamente o quanto que eles lucram, mas o que eu vejo de nocivo é que funcionando SÓ desse modo, não estamos produzindo conteúdo, estamos produzindo desejos e o livro se torna só um objeto envolto em uma relação totalmente mercadológica, o que não faz sentido então atribuir um significado revolucionário se como ele nos chega e é repassado está totalmente imerso nessa lógica mercantil.

Sendo parceira de uma editora grande, eu vou receber cerca de 12 livros no ano, que poderiam ser livros que talvez eu não quisesse ler agora, mas vou precisar tirar o meu tempo pra fazer aquilo, e dai a gente toma isso por vantajoso apoiado em duas noções perigosas: acúmulo e status de poder.



E ai alguém diz: "Eu acho vantajoso porque quanto mais livros melhor, porque eu vou aumentar minha estante, porque em teses seriam livros que eu provavelmente compraria, etc, etc.", o que também quer dizer "e eu publicizo isso porque me dá um status de relevância, de ter sido escolhida por aquela empresa para representá-la". Mas não fia, eles não sabem nem seu nome! Acredite. 

Sua importância e relevância no mundo não é o que seus números mostram, e nem sempre isso é totalmente real, uma pessoa sem muitos seguidores pode ser tão foda e relevante e interessante quanto uma com milhares, e temos que quebrar com esse raciocínio do valor de uma pessoa estar atrelado a esses números urgentemente, pois isso está adoecendo as pessoas! ME adoeceu e eu sei que não sou a única. 

Então se a gente se submete a esse processo, estamos ajudando a roda a girar de um jeito só, como disse a Vrá Tatá.

Mas óbvio que de tanto a gente seguir pessoas que tem parcerias e parecem felizes e contentes, você quer ter também, é isso que o Instagram faz com você: é um espaço que produz desejos que você não tinha até ver outras pessoas terem coisas que você nem achava que "precisaria" ou tinha desejo de ter. Por que estamos no que? No capitalismo.

Eu sei que todo esse texto parece ofensivo para pessoas que realmente se esforçam para criar algo na internet, desculpem, não quis mesmo ofender ninguém nem deslegitimar o trabalho de vocês, eu encontrei muitas pessoas que admiro acompanhar na Internet e torço muito por cada uma, são pessoas que mesmo eu estando fora do Instagram procuro acompanhar em outras plataformas como Youtube e podcast, mas numa frequência bem  reduzida e mais saudável para mim. 

Eu sei que para algumas dessas pessoas é realmente esse o trabalho que elas querem ter e precisam, infelizmente, dançar conforme a música.  

É só que as redes sociais ainda não estabeleceu uma fronteira, como em outras áreas, por exemplo, nem todo mundo quer ser advogado, dentista só porque vai no dentista ou usa servições de um advogado. 

Já o Instagram é uma ferramenta que se iniciou para publicar comportamento, vida pessoal que se transformou em "como fazer da sua vida um rendimento capital" (algo me diz que esse era o objetivo malicioso desde sempre). 

Por mais que os booktubers, bookgrams digam "esse é o meu trabalho, não se baseie por mim", a fôrma, ou seja, a plataforma de comunicação diz: se baseie por mim. 

Então, um "consumidor" vê alguém que está há 7 anos trabalhando para chegar num patamar x, e é impulsionado a achar que se fizer certas coisas isso também o fará importante. 

Eu não falo isso só porque foi algo que ocorreu comigo, eu sei que não é assim com todo mundo, mas é assim com muita gente, eu acho simplesmente muito bizarro ver pessoas no dia a dia usando a linguagem de influencers e "blogueirinhas" e se importando com o número de seguidores quando o trabalho delas real não depende disso.


Vi também que está crescendo o a quantidade de produtores parando com seus conteúdos justamente por estarem muito ansiosos com tudo isso, Vi recentemente uma youtuber de bullet journal, a Amanda Rachel Lee (VEJAM ESSE VÍDEO!), com um depoimento muito importante e sincero. Não estou torcendo para todo mundo fazer isso, não mesmo! Porque é no fim extremamente triste que tenhamos que chegar a um estado mental de exaustão até decidir dar um tempo como a Amanda, é triste, isso nos entristece um pouco porque foi dedicado um tempo enorme para isso que agora tomou de conta das pessoas de um jeito negativo. 

"Eu sou estou tentando desenhar e me divertir na internet" (Amanda Rachel Lee)

Claro que isso não vai acontecer com todo mundo, não é como se fosse tipo predeterminado ou inevitável, eu conheço pessoas que simplesmente estão na internet há muito tempo e não se afetam assim de maneira alguma, mas são minoria e acredito que está atrelado, claro, a um fortalecimento interior e pessoal. 

Pessoas inseguras e com algum problema podem piorar com as redes sociais, pessoas que talvez não sejam inseguras nem tenham problemas com comparação e toda essa ideia de sucesso podem passar ilesas, mas a nossa sociedade em geral não é desenvolvida para  que pessoas cresçam assim, infelizmente. Não é que as redes sociais criem pessoas inseguras e com problemas de ansiedade, mas acredito que piora quem já tiver algumas dessas questões. 

Piora porque funciona como o mundo já funciona: competitivo e capitalista. E falar de livros, por mais incrível que seja, dentro dessas plataformas se deixarmos levar essa comunicação pela mesma lógica, então também é só mais um tipo de válvula do mesmo cano de esgoto. (desculpem, ser tão agressiva!!)

É só que precisamos discutir mais sobre isso, ou eu preciso, não sei, existe muita coisa muito mais importante para se debater no mundo, claro!! Mas dentro de uma certa bolha de privilégios para se preocupar, eu vejo que isso afeta muita gente, está afetando nossos adolescente e nossas crianças até! E.. principalmente mulheres sim! (prestemos atenção). 

E quando a gente vê tanta gente jovem dizendo que sente tanta pressão nas redes sociais e em criar conteúdo é tão absurdo que tudo isso tenha gerado essa pressão enorme e ao mesmo tempo, fútil, digo isso pra mim mesma, quando a gente podia estar sentindo toda essa angústia com tipo... o mundo como é... mas as redes sociais nos tornou tão tão individualizados... e como quem "trabalha" com isso não pode tirar um tempo off, e tem que agir daquele jeito (preocupado com os algorítimos), porque se não, não vai atingir tais objetivos, (como ser paga para divulgar uma editora, por exemplo). 

Um trabalhador não tem que avisar a todo mundo que vai tirar férias e se preocupar se vai perder seu emprego, pois isso é direito garantido, mas um produtor de conteúdo tem meio que "milhares de chefes". Enfim, é tudo muito bizarro e as pessoas não falam sobre tudo que está por trás o que gera tudo isso, apenas agem como se fosse tudo natural.

Esse texto está extremamente gigante, e eu acabei dedicando algumas horas para escrevê-lo, mas eu preciso mesmo formular esse pensamento e externalizá-lo, para compreender tudo isso melhor, e a importância das minhas decisões. 

Este ano eu tentei, sim, parceria com duas editoras, não passei, pois não estava enquadrada em tudo isso que eu disse. De início me bateu um "poxa vida", que passou pois já tinha excluído a conta e meio que deu menos vontade de voltar e me fez pensar nessas questões. E você pode pensar "ah, tá falando tudo isso por inveja e frustração", mas não, como já citei, pessoas "bem sucedidas" na internet também estão falando disso.

Desculpa, mais uma vez, se de alguma forma fui agressiva, nada disso é direcionada para ninguém específico, só precisava mesmo refletir melhor sobre essas coisas. 





2.2.20

Janeiro




agora que chegou Fevereiro, eu sinto que realmente estou em 2020, talvez porque tenha passado o meu aniversário, dia 28, e eu estava esperando essa data para virar algumas chaves, destrancar algumas portas, liberar algumas angústias.

as primeiras angústias eram relacionadas ao meu próprio aniversário, mas não vou trazer minha análise terapêutica pra cá, acho que aos 29 anos consegui resolver grandes questões que eu tinha durante esse período. 

Janeiro foi um tempo de entender minhas relações pessoais, quem eu quero e quem pode estar comigo, quem eu posso entender e quem eu não sou capaz de aceitar também, e me livrar da ideia de que eu preciso aceitar todo mundo do jeito que as pessoas são (quando isso me fazia sofrer). 

No dia 01 de Fevereiro, resolvi deletar temporariamente minha conta do Instagram, algo que eu já fiz algumas vezes, mas desta me sinto mais "preparada" para realmente ficar um tempo fora, vi alguns vídeos e li textos com depoimentos de outras pessoas e a minha principal razão era de focar mais em algumas conquistas a longo prazo, expliquei um pouco sobre isso na minha newsletter, em que vou voltar a mandar quinzenalmente. 

Leituras Concluídas:

1. Como se fosse a casa 
2. The cacther in the rye (começado em 2019)
3. Eu sei porque o pássaro canta na gaiola (começado em 2019)
4. O mundo de Aisha (HQ)
5. Mulheres na Luta (HQ)
6. Um defeito de cor (começado em 2019)
7. Só para maiores de Cem anos (poesia)
8. Harry Potter e a Pedra Filosofal 
9. Breve História do Feminismo ( para o clube Leia Feministas )
10. Contos Negreiros 

Li 4 contos de Virginia Woolf, para o projeto de ler um conto da Virginia por semana. 

Não-concluídos:

- Poesias escolhidas - Gabriela Mistral
- A Viagem 





Resenha: Seja homem (JJ Bola - Editora Dublinense)

  Seja Homem é um livro que busca analisar a construção da masculinidade no patriarcado, discutindo como as práticas do que seria “ser um ho...