13.12.18

[ comentário ] Coral e Outros Poemas



Acho que o que posso primeiramente dizer de Sophia de Mello Breyner Andreser é que em sua poesia há poesia. Saia da obviedade dessa frase e pense o que é a poesia, o que é de fato a poesia, não, não são métricas ou formas. Esqueça isso... a poesia é outra coisa. Eu reencontrei esse significado lendo Sophia. Li bastante poesia esse ano, pois é meu gênero favorito e li muita coisa diferente, alguns me faziam pensar, outros eram marteladas, e Sophia me trouxe para uma certa origem do que me fez aos 13 anos me apaixonar por poesia, foi quando eu li Fernando Pessoa.. talvez os portugueses tenham mesmo esse talento da poesia que é quase como um feitiço. 
A cada poema eu via a imagem da poeta dias e dias a beira mar, escrevendo porque não há existência sem poesia. É isso que sinto ao ler Sophia e Pessoa, a poesia e a vida são uma só. E não é possível caminhar, ver o mar, respirar sem fazer poesia. Por isso tudo é tão simples e tão íntimo e profundo. É um cliché falar do mar ao comentar sobre a obra de Sophia, pois ele está presente em tudo. Mas creio que há uma chave para virar, não é que seja "redundante" que ela fale tanto do mar, mas que o mar é redundante por si só, mas também sempre revigorante e misterioso ao mesmo tempo, então mesmo que o mar seja o tema principal da maioria de seus poemas, há sempre algum sentimento que não finda dentro da gente, como a própria existência do mar, que não cansa de ir e vir. A poesia de Sophia é o próprio mar nesse movimento incansável de ser poesia.

Sabemos como o mar se comporta, sabemos como as ondas quebram, sabemos o horário da maré cheia e da maré baixa, mas ainda assim.. o poeta, esse que se encanta com a banalidade de tudo é capaz de escrever centenas de poemas diferentes sobre a rotina salgada das águas, sobre o encontro marcado da espuma com os grãos de areia. A ciência já pode ter desvendado todos os mistérios da natureza, mas é o poeta que os torna.. mágicos novamente. 


Sugestão de música para acompanhar: 5:55 de Charlotte Gainsbourg

11.12.18

Nós Existimos

A literatura, substantivo feminino, no entanto, é masculina. A literatura é masculina. Clarice Lispector, Chimamanda, Toni Morrison.. mulheres que escreviam e escrevem histórias sob a perspectiva de personagens femininos. Você tem ideia o quão isso é... revolucionário isso é? Abro um livro, escrito por um homem, personagens centrais: homens, clássico, quando não é clássico mesmo é clássico marginal. Mulheres da história? Ocupam posições "inferiores" e nas primeiras aparições já entram para compôr alguma situação sexual com o homem.. não, o livro não é o ruim, ele é muito bom, estou me divertindo, mas cansa. Cansa esse mesmo quadro. Cansa. Imagina então... se não lêssemos mulheres? Talvez nem existíssemos.. mas existimos, resistimos. Nossas narrativas existem, nossas histórias importam, nossas lutas, nossos pensamentos, nosso sexo também. Quantos livros existem de homens se masturbando? E em quantos há mulheres gozando? Por que por que vocês simplesmente não se importam? Por que quando escrevem sobre nós é para o ego dos personagens de vocês? Você não conhecem mulheres que lutam, que choram, que amam,que são livres, que são fortes que possam passar mensagens de coragem e beleza para outras mulheres? Elas não existem? Talvez não e nem a literatura escrita por homens se deu ao trabalho de inventar.


2.12.18

TBR Dezembro

Reta final do mês, hoje dia 02 pretendo terminar Devoção (Patti Smith) e prosseguir um pouco mais  com Coral e Outros Poemas (Sophia de Mello Breyner Andresen). Faltam 100 páginas de Jazz (Toni Morrison), creio que termino até o fim dessa semana. Ainda tenho que encaixar a releitura de A Mãe para discussão no meu grupo de teatro até sexta (07/12). Ainda nessa semana tenho um seminário para apresentar e na próxima a prova final de Libras. Já desisti dessa cadeira uma vez porque a professora sempre deixa para fazer essa prova depois que estamos praticamente de férias, isso pode ser bom por um lado, porque não fica tudo junto, mas por outro meu cérebro já entra no modo férias e eu não consigo mais me concentrar em nada. Mas tô confiante que neste ano vou aguentar tudo isso. Falei que tem o plus de eu estar dando aula e ser bolsista também? Pois é, ainda tenho que apresentar um artigo num seminário da faculdade. Muitas vezes eu penso que tudo que eu tenho na minha vida é a tentativa, já me sabotei muito e em alguns momentos acredito que tudo isso que vivo é uma grande farsa, porém estou vivendo né, se for uma farsa eu vou descobrir logo, por enquanto é tudo que tenho, é tudo que consegui conquistar e construir.

Do dia 10 ao dia 14 eu pretendo começar Detetives Selvagens (Roberto Bolaño) e conciliar com os contos de No seu Pescoço, da Chimamanda. 

São 12 contos de NSP o que daria 4 contos por semana, mais ou menos um conto por dia.

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Já Detetives Selvagens são 622 páginas que dividido por 20 dias (10 a 31), dá em torno de 30 pgs por dia. 

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1.12.18

[ Comentário ] O que é Empoderamento - Joice Berth



O que é Empoderamento? é um lançamento do grupo editorial Letramento, que faz parte da coleção Feminismos Plurais, coordenada por Djamila Ribeiro. Falando primeiramente da coleção, todos os livros são escritos por autores negros e autoras negras, possuem uma linguagem teórica acessível e desse modo ampliam o debate sobre temas urgentes como feminismo negro, empoderamento, racismo estrutural, lugar de fala, entre outros. Os livros não procuram encerrar os temas, mas sim abrir caminho para discussões formulando um pensamento dialético muito importante. Surpreendem quem pensa que estes assuntos passam por mero "achismo", os autores trazem uma vasta pesquisa acadêmica dando espaço e foco para o pensamento de estudiosos e estudiosas negras que em geral não são vistos como referência intelectual dentro de um sistema academicista branco e machista. 


Este é o segundo livro da coleção que leio, e como feminista branca só tenho a agradecer e aprender; tenho revisto conceitos e posicionamentos.

A discussão em torno do conceito de empoderamento tem sido cada vez mais presente em rodas informais de conversa, uma dos pontos de importância desse livro se dá em justamente trazer esse conhecimento para uma esfera "acadêmica" também, se tornando referência de estudo nas universidades. Quando debate-se o assunto, tudo gira muito em torno "da opinião de cada um", no entanto Joice Berth vai procurar a origem do termo e como se dá sua prática na vida principalmente da comunidade negra, voltando o olhar para a importância de entendermos esse termo para além de um sentimento individual, mas sim uma ação que deve refletir em mudança coletiva. Para isso, Berth cruza a ideia de empoderamento com feminismo negro, pensando em como as duas práticas são vivenciadas por mulheres negras e como isso pode ajudar a emancipação coletiva dessas mulheres.

Não é que o empoderamento não deva ser utilizado por mulheres brancas, mas pensando na interseccionalidade de opressões, nós mulheres brancas precisamos ter consciência que empoderamento vai muito mais além de um bem estar pessoal, e em como reproduzimos este "empoderamento" que muitas vezes passa por reprodução da opressão de corpos brancos para com corpos negros. Dai a polêmica por exemplo nas mídias sociais quando perguntam: "uma mulher postando uma nude é empoderamento?". Muitos desdobramentos aparecem com essa questão, mas sinto que falta leitura e aprofundamento do debate quando este acontece só por comentários. As pessoas falam "mas você não pode dizer para outra mulher o que ela deve fazer ou não, você não pode dizer para uma outra mulher o que é empoderamento", etc. Há uma distorção entre crítica e "proibição", quando há alguma crítica as pessoas já pensam que estão sendo proibidas de algo. Mas penso que isso se trata de um pouco de ego inflado; rever privilégios passa por esse lugar da crítica, querendo ou não, e o que Joice Berth traz no livro não é uma cartilha ou os dez mandamentos da mulher empoderada, mas sim um modo de pensarmos coletivamente como este termo vem em benefício de todas e não somente para perpetuar privilégios. Se para isso mulheres brancas terão que rever atitudes que talvez antes eram "liberadas" ou ditas "normais" (afinal, o bem estar pessoal de uma mulher branca magra, etc é bancado pela mídia, então que revolução é essa?), acredito que faz parte de um processo emancipatório maior do que o individualismo, se eu acho que o meu empoderamento "atrapalha" alguma coisa, talvez eu não esteja entendendo esse empoderamento numa esfera coletiva, que é o principal foco. 

Mas essas são minhas reflexões, vamos ao que interessa: o que há no livro de Joice Berth.


O primeiro capítulo que recebe o mesmo título do livro é uma apanhado geral da origem teórica do termo empoderamento. A autora passa pelos conceitos de Hannah Arendt e Focault sobre o que é poder, para assim pensarmos o empoderamento hoje. Em seguida passa por um breve histórico da origem da palavra em si, mostrando que este conceito acabou sendo incorporado de modo a fugir de seu significado original e estratégico. Berth também cita Paulo Freire e sua Teoria da Conscientização e por fim faz uma síntese das diversas teorias que juntas formam a ideia de empoderamento que ela deseja mostrar.


No segundo capítulo, a autora fala da relação de opressões estruturais com a prática do empoderamento, e pensar que a aplicabilidade da Teoria do Empoderamento, depende dessas opressões estruturais, ou seja, empoderamento também tem a ver com racismo, consciência de classe e machismo. Berth fala também do esvaziamento do termo na atualidade que gera essa dualidade individual x coletivo. Além disso fala das barreiras de grupos oprimidos ao conhecimento acerca do empoderamento. E nisso dá exemplos práticos de como mudar esse quadro. 


O terceiro capítulo trata da prática de mulheres negras que assimilam a noção de empoderamento em suas vidas antes mesmo de ter acesso ao conhecimento formal do tema. Nesse sentido, Berth ressiginifica o conceito pela experiência do feminismo negro e de formas coletivas de superação das opressões adotadas pelas comunidades negras. 


No quarto capítulo, Berth aborda a questão da estética, pois esta também está associada ao poder. Assim, a autora tece críticas sobre como a população negra carece de uma representação esteticamente "empoderadora" na sociedade, no sentido de se verem em capas de revistas, em personagens bem sucedidos nas novelas, filmes e livros, etc. Intelectualmente e esteticamente negros e negras não são referência em igualdade com brancos, isso diz tudo sobre relações de poder e empoderamento. A suposta inferioridade da aparência negra foi usada para justificar o sistema de opressão. Berth também fala sobre a afetividade dentro das relações amorosas das mulheres negras, que se vêem como "desasjustadas" e são tratadas muitas vezes como descartáveis, gerando um sentimento de "auto-ódio". Porém, a autora atenta que a questão estética é importante, mas não o mais importante ou o único foco.

Nas considerações finais, Joice Berth sintetiza os principais pontos de sua pesquisa, salientando também que o processo de empoderamento passa pelo individual sim, mas visa o coletivo e também da impossibilidade de um empoderar o outro. Importante lembrar que é um processo antes de tudo político que visa mudar o estado atual das coisas, portanto é preciso estar atento para venda de um empoderamento que não mexe com as estruturas de poder de fato.

"Empoderamos a nós mesmos e amparamos outros em seus processos"

Resenha: Seja homem (JJ Bola - Editora Dublinense)

Seja Homem é um livro que busca analisar a construção da masculinidade no patriarcado, discutindo como as práticas do que seria “ser um home...