13.4.20

[Resenha] Prólogo, ato e epílogo - Memórias de Fernanda Montengero


Com quase um século de vida, finalmente conhecemos a trajetória desta grande artista. Fernanda Montenegro escreve suas memórias entre 2017 e 2019, com a ajuda das entrevistas feitas por Marta Góes, entre 2016 e 2017. Em Prólogo, ato e epílogo, Fernanda usa das divisões clássicas de um texto para narra sua vida. No prólogo conta a história da vinda de seus antepassados para o Brasil, "uma realidade brutal de sobrevivência". Desse modo, a atriz já provoca em nós o reconhecimento de que sua história não começa a partir do  seu nascimento, mas vem de antes, que ela é continuidade de lutas e sonhos. Da mãe, vem a origem italiana e do pai, a portuguesa.

Em ato, ela conta como deixou de ser Arlette Pinheiro da Silva para ser Fernanda Montenegro, encontrou seu companheiro de toda a vida, Fernando Torres, constituiu sua família, viveu entre glórias e lutas a arte do ator, nos palcos e nas telas, mas principalmente sua vida nos palcos. 

Com muita humildade ela conta todos os perrengues que passou pelo sonho de viver O e DO teatro. Mesmo quando teve que começar a trabalhar na tv que era  o que davao sustento para manter-se com o grupo que fundou com o marido, não abandonava os palcos.

Terminamos de ler suas memórias com uma bagagem além de sua vida, mas com o conhecimento do que foi o teatro brasileiro, no eixo Rio-SP, durante décadas. Ela nunca fala só sobre se e comenta de vários nomes importantes do nosso teatro, me emocionei por essa ideia de coletividade tão bonita. E também por ver a grande intelectual que Fernanda é, num mundo que hoje ser atriz na tv é quase sinônimo de ser apenas uma celebridade, ela fala de uma época que ao ator era exigido ler de tudo; e ávida pelo conhecimento, ela lia todos os clássicos e autores do momento. 

Conta como foi passar pela ditadura militar, em que foi perseguida, e as maneiras de continuar resistindo em tempos sombrios. Ao mencionar seus prêmios e conquistas, percebemos que tudo isso foi consequência de uma vida inteira dedicada integralmente à arte. 

Ela relata a instabilidade da vida artística, e como durante décadas, ela e o marido estavam sempre tentando driblar as dificuldades, dos momentos em que não sabiam como pagar o aluguel do mês e ensaiavam de madrugada para dar conta do teatro e dos trabalhos na tv. 

Uma biografia emocionante e digo que essencial não só para atores e amantes do teatro, mas qualquer um que queira saber mais da arte no Brasil pelas memórias de uma grande mulher. Quero salientar que Fernanda não é perfeita, algumas coisas eu discordo dela sim, mas isso de maneira alguma retiraria minha admiração por sua trajetória. Acho que em algumas situações (ALGUMAS) é possível discordar de uma artista e ainda admirá-la. 

"Por mais longa que seja a vida do ator, ele não tem como declarar "Estou pronto". E se o fizer, não é do ramo". 

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