Em "Os trabalhos e as noites" a poesia de Pizarnik se faz
portal para um mundo de amantes soturnos que se olham e se fundem exasperados.
Na foto da quarta capa, Pizarnik nos olha com intensidade, assim como o poema é
convite para abrir passagens entre a carne. O corpo é uma imagem presente em
todo o livro, seja o corpo inteiro, ou em partes. A poeta trancafiada dentro de
si, só entrega-se para que o leitor se revele também ou se perca. O corpo é
espaço para revelações, lugar da ferida, mudo, fogo incessante, barco náufrago.
Apesar da noite silenciosa, a poeta clama ao interlocutor que fale. A voz,
longe ou perto, é elemento constante - "tua voz/neste não poder arrancar
as coisas". É através do verso que ela procura romper com a solidão que
"agora não está a sós". A poesia "fala como a noite/anuncias
como sede". Esta noite, pode durar muito tempo, pois "a noite é
presença", e é por vezes cortada pela luz;
para atravessá-la, só é possível se a ela nos fazemos de oferenda.
Baixei o livro aqui
Baixei o livro aqui
//
revelações
Na noite a teu lado
as palavras são senhas, são chaves.
O desejo de morrer é rei.
Que o teu corpo seja sempre
um amado espaço de revelações.
//
encontro
Alguém entra no silêncio e abandona-me.
Agora a solidão já não está só.
Tu falas como a noite.
Anuncias-te como a sede.
//
os trabalhos e as noites
para reconhecer na sede o meu emblema
para concretizar o meu único sonho
para nunca mais voltar a sustentar-me no amor
fui toda oferenda
um puro errar
de loba no bosque
na noite dos corpos
para dizer a palavra inocente
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