Volto Semana que Vem é um livro de relatos que conta a vivência da autora enquanto presa e exilada durante a ditadura brasileira e argentina. Os escritos oscilam entre passado e presente, não seguem ordem cronológica alguma, mas os títulos sempre mencionam o ano e o local em que a história se passa. Mistura denúncia e memória; lembranças cruas, secas, e leves também. Maria fala de momentos que passou e outros que escutou no período em que esteve em cárcere e outros em que foi exilada durante 20 anos do Brasil, avisando para o pai que "voltaria semana que vem".
O livro é quase todo narrado em primeira pessoa, e o que não está, é tão próximo da autora, que acredito que é como se fosse ela também. Cada história de alguma mãe de um desaparecido político, cada esposa, filho, filha, parente que perderam tantos entes queridos para esses dois regimes cruéis, é um pouco de Maria Pilla, é um pouco eu e você, que sente sempre precisar ter estado lá. Porém, Maria conta tudo isso secamente, sem adjetivos, sem nada além do que aconteceu, como jornalista, no cerne da profissão, ela resolveu escrever os fatos. O tom nada poético de Maria beira um documento policial, e por conta disso, o livro é acusado de frio. Vi algumas pessoas dizendo não ter "sentido" as histórias, e eu me pergunto: o que mais é preciso dizer para sentir a dor da crueldade de um escritor que é perseguido e leva 52 tiros? Se Maria Pilla escreve "morreu com 52 tiros", não preciso de nada mais para saber da pervesidade de 52 tiros. Os números, o ato, o ano, as razões, já são por si só a violência, sem adjetivos.
Não se falta intensidade, pois não trata-se aqui de ficcionalizar a realidade ou tornar o horror mais próximo do que já é.
Não se falta intensidade, pois não trata-se aqui de ficcionalizar a realidade ou tornar o horror mais próximo do que já é.
Assim é que Maria Pilla se faz importante com seu "livreto", que pesa muito mais do que a balança conta. Volto Semana que Vem tem o peso histórico que as palavras podem até não dar conta, e deve ser por isso que Maria Pilla escreveu desse modo, o julgamento dos fatos, os adjetivos ficam para o leitor. Em uma entrevista ela mesma fala: “Não sou vítima, eu escolhi a militância”
Sul21- O que te levou a escrever agora um livro de memórias? Maria Regina Pilla – Há anos, tinha vontade de escrever um livro, de botar no papel tudo aquilo, que, apesar de ter feito análise, continua me incomodando. Escrever o livro foi como me livrar de um problema, me livrar de um período da minha vida que foi bacana, no qual aprendi muita coisa, mas também enfrentei coisas bem difíceis. Deixei para escrever as partes ruins todas juntas. Foi bem difícil. Era uma coisa sofrida, que vinha de dentro. Cuidei para que o texto tivesse um tom de não truculência, pois não interessa, já contaram, todo mundo já sabe como é que é (a prisão, a tortura). Fiz outro tipo de abordagem, todos que leram viram isso, um jeito diferente de contar esta história.
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