Em "Não vou mais lavar os pratos", o poema que leva o nome do livro é uma revolução, ao "abrir um livro e uma semana depois decidir: não levo mais o lixo para a lixeira". E mais na frente diz "resolvi ler o que se passa conosco / você nem me espere". A poesia não é um luxo, já dizia Audre Lorde. É na palavra que o eu-lírico reescreve a história, aprende a ler o mundo, e não aceita mais os moldes que "esperam" que pessoas negras representem.
Os versos de Cristiane rompem esteriótipos de submissão, como em Sonho de Consumo, quando ela que determina seus desejos e condições em um relacionamento. Nos poemas sobre relacionamentos são permeados pela força de uma mulher que não aceita migalhas ou menos do que merece. Esse sentimento é muito importante, pois a questão do preterimento afetivo de mulheres negras é parte também do racismo estrutural.
Porém, os poemas representam uma emancipação da espera por aceitação alheia, ao celebrar toda a maravilhosidade de ser quem se é, e ao invés de esperar, ela "abandona a convicta e confortável clareza das coias". Também enaltece a beleza negra e suas raízes, em poemas como "Escova Progessiva?", "Pixaim Elétrico" e "Algodão Black power".
O livro é repleto de poemas de coragem e força, mas a poeta não esconde suas dores, fala de solidão, medos e aponta para um caminho de Resiliência e esperança guiado por "poemas faróis".
Comprei esse livro diretamente com Cristiane Sobral para presentear minha amiga Amanda Benevies (veio a pandêmia e ainda não consegui entregar o presente). Na ocasião Cristiane deu uma aula de abertura de um curso para mulheres negras. Essa aula era aberta ao público, não só as alunas do curso e como já admirava o trabalho de Cristiane pela internet fui prestigiá-la presencialmente.
Não pude deixar de perceber que eu era uma das poucas mulheres brancas na sala e meu namorado o único homem branco. Em uma sociedade que elimina corpos negros diariamente, nós pessoas brancas, estamos tão acostumados a sermos protagonistas o tempo todo, a termos a voz principal em todo lugar, a sermos nós os homenageados ano após ano em premiações, e a tudo isso ser normalizado, que a gente esquece que não, não somos o centro do mundo.
Foi importante ver um lugar em que mulheres negras pudessem encontrar força, afeto e amaparo e é esse lugar que se ergue na poesia de Cristiane Sobral.
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