20.8.17

Livro do Desassossego

""O coração se pudesse pensar, pararia", // 

"No meu coração há uma paz de angústia, e o meu sossego é feito de resignação" // 

"Pedi tão pouco a vida e esse mesmo pouco a vida me negou [...] o não me pesar muito o conhecer que existo, o não exigir nada dos outros nem exigirem eles nada de mim... Isto mesmo me foi negado, como quem nega esmola não por falta de boa alma, mas por não ter que desabotoar o casaco" // 

"é assim que sou, fútil sensível, capaz de impulsos violentos e absorventes, maus e bons, nobres e vis, mas nunca de um sentimentos que subsista, nunca de uma emoção que continue, e entre para a substância da alma. Tudo em mim é tendência para ser a seguir outra coisa; uma impaciência da alma consigo mesma, como com uma criança inoportuna; um desassossego sempre crescente e sempre igual. Tudo me interessa e nada me prende" - trecho 10 // 

"Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir." - trecho 12 //"

"35. "a única realidade para cada um é a sua própria alma, e o resto - o mundo exterior e os outros - um pesadelo inestético, como um resultado nos sonhos de uma indigestão de espírito." // 

36. São as pessoas que habitualmente me cercam, são as almas que, desconhecendo-me, todos os dias me conhecem com o convívio e a fala, que me põem na garganta do espírito o nó salivar do desgosto físico. É a sordidez monótona da sua vida, paralela à exterioridade da minha, é a sua consciência intima de serem meus semelhantes, que me veste o traje de forçado, me dá a cela de penitenciário, me faz apócrifo e mendigo. // 

38. Invejo a todas as pessoas por não serem eu // 

39. E por fim, tenho sono, porque, não sei porque acho que o sentido é dormir 41. Verifico que tantas vezes alegre, tantas vezes contente, estou sempre triste"

""É uma sensação de uma ebriedade de inércia, de uma bebedeira sem alegria, nem nela, nem na origem, É uma doença que não tem sonho de convalescer. É uma morte álacre. // 

Sou do tamanho que vejo // 

A solidão desola-me; a companhia oprime-me //

"68. O cansaço de todas as ilusões e de tudo que há nas ilusões - a perda delas, a inutilidade de as ter, o antecansaço de ter que as ter para perdê-las, mágoa de as ter tido, a vergonha intelectual de as ter tido sabendo que teriam tal fim.// 

71. " [...] é que a maioria pensa com a sensibilidade, e eu sinto com o pensamento. Para mim, pensar é viver e sentir não é mais que o alimento de pensar." // 

77. "EM geral sou uma criatura com quem os outros simpatizam, com quem simpatizam, mesmo com um vago e curioso respeito. Mas nenhuma simpatia violenta desperto. // 

78. Como se não tivéssemos dormido, sobrevive em nós qualquer coisa de sonho, e há um torpor do sol do dia a aquecer a superfície estagnada dos sentidos. É uma bebedeira de não ser nada, e a vontade é um balde despejado do degrau para o quintal por um movimento indolente do pé à passagem" 

79. Minha alma está cansada da minha vida// 

80. Tudo me cansa, mesmo o que não me cansa. A minha alegria é tão dolorosa como a minha dor. //

Entre mim e a vida há um vidro tênue. Por mais nitidamente que eu veja e compreenda a vida, eu não lhe posso tocar"

"Há momentos em que tudo cansa, até o que nos repousaria. O que nos cansa porque nos cansa; o que nos repousaria porque a ideia de o obter nos cansa [...] 
Reduzindo-se, assim, a seres couraçados contra o mundo, não admira que, em certa altura da sua consciência de si-mesmos, lhes pese de repente o vulto inteiro da couraça, e a vida lhes seja uma angústia às avessas, uma dor perdida.Estou em um desses momentos, e escrevo estas linhas como quem quer ao menos saber que vive.[...] 
Viver parece-me um erro metafísico da matéria, um descuido da inação. Nem olho o dia, para ver o que ele tem que me distraia de mim, e, escrevendo-o eu aqui em descrição, tape com palavras a xícara vazia do meu não me querer. [...]
Tenho mais sono íntimo do que cabe em mim. E não quero nada, não prefiro nada, não há nada a que fugir. pg 129"


""cada qual tem seu álcool. Tenho álcool bastante em existir. [...] Sou igual. E por trás de isso, céu meu, constelo-me às escondidas e tenho meu infinito. pg 137

"nunca amamos alguém. Amamos, tão-somente, a ideia que fazemos de alguém. É a um conceito nosso - em suma, é a nós mesmos que amamos." pg 138 

"a maioria da gente enferma de não saber dizer o que vê e o que pensa" pg 141 

"sou curiosos de tudo, ávido de tudo, voraz da ideia de todas. Pesa-me como a perda de [] a noção que tudo não pode ser visto, nem tudo lido, nem tudo pensado..." "escrevo com uma grande intensidade de expressão; o que sinto nem sei o que é. Sou metade sonâmbulo e a outra parte nada" pg 145 

"Diziam os argonautas que navegar é preciso, mas que viver não é preciso. Argonautas, nós, da sensibilidade doentia, digamos que sentir é preciso, ams que não é preciso viver" pg 147 

"só lamento o não ser criança, para que pudesse crer nos meus sonhos, o não ser doido que pudesse afastar da alma de todos os que me cercam" 

""Se tenho o amanhã, não sei senão que não dormi, e a confusão de vários intervalos põe grandes silêncios na minha fala interna" pg 188 

"Posso imaginar-me tudo porque não sou nada. Se fosse alguma coisa, não poderia imaginar" pg 187 

"quem sou eu pra mim? só uma sensação minha o meu coração esvazia-se sem querer como um balde roto." pg 172

"Tenho os olhos pesados de supor" pg 162 

"escrevo como quem dorme, e toda a minha vida é um recibo por assinar" pg. 160 

"O peso de sentir! O peso de ter que sentir"

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